É necessário estar dois passos à frente para vencer a crise nas finanças

Publicado em 07/11/2016

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Quem nos negócios já caiu para a segunda divisão -assim como times que largam na frente e terminam na lanterna no campeonato brasileiro de futebol -sabe bem os riscos que corre até mesmo quando as coisas vão bem. Aprendeu que o jogo pode virar rapidamente e acostumou-se a olhar para a frente, na ânsia de antecipar-se a um cenário futuro. Na prática, essa metáfora futebolística significa que as pequenas e médias empresas devem, neste momento, fazer o exercício da antecipação. E, assim, deixar a gestão financeira em ordem para 2018 - o ano em que se espera uma recuperação mais consistente da economia, disse Mauro Johashi, sócio da consultoria BDO, que nesta quinta-feira (27/10) participou do FE4 Forum Empreendedor, promovido pela Associação Comercial de São Paulo (ACSP). Segundo ele, cresceu o número de consultas de investidores locais e internacionais interessados em adquirir empresas brasileiras, por meio de processos de fusões e aquisições, geralmente não focando no momento atual, mas no lucro que poderão obter quando a economia retomar o vigor. A preparação sugerida pelo consultor depende da situação de cada empresa que está atravessando a pior recessão econômica da história do país -uma vez que, desde 2014, o PIB (Produto Interno Bruto, soma das riquezas do país) registrou nove quedas trimestrais consecutivas. O reflexo do recuo da atividade econômica sobre as finanças das empresas foi brutal. Em setembro passado, os pedidos de recuperaçao judicial cresceram 65% na comparação com igual mês de 2015, de acordo com levantamento da Serasa Experian. Foram 244 requerimentos no mês -176 aceitos pela justiça. A recuperação judicial é vista como uma saída para a empresa reorganizar as dívidas com os credores, sempre com o propósito de que ela possa se recuperar. Se isso não ocorrer, ela decreta a falência.. Mas, historicamente, poucas conseguem realmente se reerguer após esse processo, de acordo com dados da Serasa apresentados por Johashi. De 2005 a 2014, 77% das empresas pediram falência e apenas 23% permaneceram ativas, ou seja, conseguiram se salvar. "Pode parecer incrível, mas esse número não é ruim. Há cinco anos, a recuperação judicial era questionada porque vista apenas como forma de postergar a dívida com instituições financeiras", disse. E uma maneira de não entrar nesse ciclo vicioso, segundo o sócio da BDO, é antecipando-se às dificuldades. O empresário que percebe que vai atrasar um pagamento ao fornecedor ou banco no próximo mês deve imediatamente buscar uma renegociação de prazo e de valor, antes mesmo de se tornar inadimplente. É o que Johashi chama de recuperação extrajudicial. NEGOCIE! "Como o mercado está indo mal, o fornecedor e o próprio gerente do banco estão mais propensos a negociar. É melhor do que não receber", afirmou. Exercer esse tipo de negociação exige, porém, que o empresário tenha em mãos números confiáveis. Isso significa não somente manter os balanços em dia, mas fazer projeções de entradas e saídas de caixa que forneçam previsibilidade e segurança para o futuro. É o que permite, por exemplo, monitorar a eficiência e a rentabilidade do negócio para saber se haverá fôlego para pagar as contas quando o faturamento cai. É importante fazer o controle mesmo quando os números são negativos. Quem não se antecipa facilmente sai de uma situação positiva para negativa. Johashi mostrou simulações que evidenciam que quanto maior for a necessidade de capital de giro de bancos pela empresa, maior será sua despesa financeira (não operacional) e menor o lucro antes de impostos e contribuições. Assim, quem toma empréstimo do equivalente a um mês de faturamento para capital de giro, a uma taxa de 18% ao ano, passa a ter uma despesa financeira que reduz o lucro de 6,35%(quando ela não tem dívida) para 4,85%. Se, hipoteticamente, o mesmo empresário tomar o equivalente a dois meses de faturamento, pela mesma taxa, terá um resultado antes de impostos de 3,35%. E assim por diante. Para que as finanças da empresa superem a crise, Johashi destacou não só a importância de manter números confiáveis e projeções, mas também atuar simultaneamente na redução de custos variáveis e em estratégias para aumentar o faturamento, seja com promoções ou mix de produtos. Quem consegue cortar 1% do custo variável, com fornecedores por exemplo, já terá um resultado melhor na última linha do balanço. É também necessário cuidado com os custos fixos (funcionários e aluguel, por exemplo), já que devem ser pagos mesmo que a empresa não fature nada. "Esse custo não pode demorar muito a ser cortado quando a demanda cai. Em empresa familiar tem de demitir até o cunhado se for indispensável", afirma. INVESTIMENTOS: ANTECIPE-SE AO CENÁRIO DE JUROS BAIXOS O ambiente propício para a redução da taxa básica de juros (Selic), mesmo que efetuado a conta-gotas pelo Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC), abre a possibilidade de investidores serem mais ousados na diversificação das aplicações financeiras pessoais. "É o momento de sair de aplicações indexadas ao CDI e estudar os veículos de investimento de dívida corporativa, como as próprias debêntures de infraestrutura, que são isentas de Imposto de Renda na Pessoa Física", disse Marcos Lanfranchi de Callis. Estrategista de investimento do Votorantim Private Bank, ele abordou durante o Fórum Empreendedor as oportunidades que surgem para os empresários, dado o contexto da economia global. A recomendação vale, no entanto, para o empresário que tem perfil e disponibilidade de recursos para investir na pessoa física e não para aquele que já arrisca suas economias para manter o próprio negócio ativo. Mas ainda que tenha conseguido manter a saúde financeira da empresa durante a crise, tendo em mãos informações estruturadas, pode aproveitar o momento para encontrar um sócio por meio de um processo de fusão e aquisição com um investidor. "O Brasil é um celeiro de operações para multinacionais, que começam a comprar ativos a um bom preço". A melhora nos indicadores de confiança em relação à economia brasileira e o avanço do ajuste fiscal têm ampliado o interesse do investidor estrangeiro, que hoje encontra juros com taxa zero ou mesmo negativos para investir em títulos com prazo de dez anos em países desenvolvidos. Países emergentes como o Brasil passam a entrar no radar do investidor internacional que aceita maior risco, até mesmo porque o seguro contra calote do País, medido pelo CDS (Credit Default Swap), diminiu pela metade desde 2015. Isso tem favorecido, segundo Callis, o desempenho do mercado de ações. O que vai determinar a recuperação da economia brasileira, segundo ele, é o avanço da reforma da Previdência. Se tudo correr conforme as previsões, a expectativa do Banco Votorantim para o crescimento do PIB é de 1% em 2017. "A queda da inflação é esperada em 2016 e em 2017, o que abrirá espaço para mais cortes de juros, que não serão agressivos, o que não é boa notícia para empresas alavancadas", disse. INOVAÇÃO PODE SER MAIS UM PASSO À FRENTE Outra forma de se antecipar à recuperação econômica -e também à concorrência -é desengavetando planos de investimentos, principalmente se forem inovadores, e iniciar a negociação para a tomada de recursos a uma taxa de juros baixos desde já. Além de estar com as projeções em ordem, o empresário não pode ter urgência ao solicitar esse tipo de recurso em banco de fomento, cuja análise leva em média 120 dias para ser realizada, de acordo com Álvaro Sedlacek, diretor financeiro e de negócios da Desenvolve SP. Na palestra, ele lembrou que o banco de fomento do governo paulista não é um "hospital de empresas". "O empresário é como a pessoa que não quer ir ao médico para não descobrir que está doente. Por isso, não quer ver os números da empresa e, assim, perde oportunidades incríveis", disse. Ele ressaltou a importância do empresário apresentar balanços contáveis críveis e confiáveis na hora de bater na porta do banco. Assim, quem chega sem as informações estruturadas do negócio tem o pedido de financiamento negado. O prazo dos financiamentos é de até dez anos, com dois de carência, e as taxas que podem ser de 0% ao mês mais IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo). Sedlacek disse que o banco de fomento está priorizando o financiamento de projetos ligados à inovação e sustentabilidade, pois o empresário que tem planos nesse sentido apresenta risco de crédito menor justamente pela capacidade de multiplicar recursos novos, de olho no futuro. De acordo com seu diretor, o Desenvolve SP também financia capital de giro e exportações. "Gostamos de projetos de investimentos de exportação e ligados à produtividade industrial. O capital de giro é o cheque especial do empresário: é importante, mas de maior risco. Por isso, avaliamos bem como o recurso será utilizado", afirmou. Diário do Comércio

Sobre o autor

Alberto Spoljarick Neto

Alberto Spoljarick Neto é o gerente de marketing e eventos da Associação Comercial e Industrial de Mogi Guaçu. Formado em Publicidade e Propaganda e Relações Públicas pela ESAMC, ele continua se aperfeiçoando em tendências de consumo de mercado e as aplicando para os empreendedores de nossa cidade.