Os trunfos de Marília para se blindar da recessão
Publicado em 27/10/2016
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Conhecida como a capital do alimento, Marília, distante 436 quilômetros da capital, foi praticamente um oásis no Estado de São Paulo desde o início da crise econômica que aflige o Brasil.
Pelo menos até agosto passado, quando a cidade de 220 mil habitantes registrou a primeira queda nas vendas do comércio, de acordo com dados da pesquisa ACVarejo da Associação Comercial de São Paulo (ACSP).
Ainda assim, a redução de 0,2% nas vendas foi bem inferior ao recuo de 7,3% registrado no varejo do Estado no acumulado do ano, de acordo com o levantamento.
Uma razão que explica por que a cidade se destaca de suas vizinhas na crise é o fato de contar com uma indústria alimentícia consolidada.
Outra é a formação de um parque tecnológico, que resultou no disparo de abertura de microempresas.
A presença de empreendimentos que mantêm e geram empregos no município contribuiu para preservar os indicadores econômicos no campo positivo, como o consumo das famílias.
Das 17 macrorregiões pesquisadas pela ACSP, apenas a que abrange Marília e seu entorno, registrou crescimento no acumulado do primeiro semestre. As vendas nessa região cresceram 1,3% no período.
Em contraste, outras regiões com perfil semelhante a de Marília registraram quedas acentuadas no mesmo período, como a RMC (Região Metropolitana de Campinas), que teve queda de 7,9%, Araraquara (-4,8%) e Bauru (-4,2%).
"Temos vocação multisetorial”, afirma Cássio Luiz Pinto Júnior, secretário de desenvolvimento econômico. O município nasceu do cultivo de café que, tempos depois, foi substituído pelo algodão.
Com a expansão da industrialização, principalmente, na década de 1970, Marília foi perdendo tradição em agricultura.
Antigas plantações deram lugar às universidades Univem, Unesp e Unimar, e a vocação da cidade se voltou para as indústrias.
Nestlé, Marilan, Harald e Dori figuram entre as principais empresas do setor alimentício, que se transformou na maior empregadora da região, com uma oferta 20% superior à média nacional.
Neste ano, entre demissões e admissões, 993 vagas foram abertas, a maior parte na indústria de alimentos e no setor de serviços, de acordo com o Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados do Ministério do Trabalho).
Em 2015, houve uma média mensal de abertura de 200 microempresas na cidade, número que cresceu para 252 neste ano. Juntas, geram aproximadamente R$ 50 milhões em recursos aplicados no município.
É importante notar que Marília abriga atualmente 15 mil universitários, a maioria vinda de outras cidades.
Esse contingente gera um impacto significativo na economia local. Além disso, esses alunos se tornam objeto de desejo das empresas que buscam cidades para se instalar com mão-de-obra qualificada.
Para o empresário Libânio Nunes de Oliveira, presidente da ACIM (Associação Comercial e Industrial de Marília), o trabalho da administração pública e do setor empresarial, nos últimos anos, refletem no bom desempenho econômico da cidade em meio ao cenário de crise nacional.
“Marília possui serviços de ótima excelência nas áreas da educação, saúde, segurança pública e com bastante eficiência e dinamismo nos setores do comércio e da indústria. Tudo isso fortalece o consumo e atrai novos investimentos", afirma Nunes de Oliveira.
A FORÇA DA TECNOLOGIA
Berço de empresas como a TAM, Sasazaki e Bradesco, a cidade também desponta como uma das cinco melhores cidades do Estado em tecnologia da informação.
Foi há sete anos que esse movimento começou a ganhar força, quando alguns empresários da área de TI, em parceria com a Univem, Sebrae e a ACIM criaram o NDS Marília (Núcleo de Empresas Desenvolvedoras de Software de Marília e Região).
Juntos, eles identificaram as necessidades comuns desse setor e passaram a promover ações: treinamentos, capacitações, palestras e programas de melhorias do processo de desenvolvimento de software.
Na opinião de Chikao Nishimura, diretor regional do CIESP (Centro das Indústrias do Estado de São Paulo) de Alta Paulista, a cidade possui todos as características para se tornar uma importante referência de desenvolvimento no Brasil.
“A cidade possui um sistema educacional de qualidade, que é fundamental para continuar a promover o seu aprimoramento tecnológico, por meio da inovação, base da competitividade das indústrias”, diz.
Mais de 200 empresas de TI atuam na região. Em geral, pequenas e médias, elas empregam ao todo 1.500 profissionais. No primeiro semestre, o emprego no setor cresceu 9%.
Entre eles, estão programadores, desenvolvedores de web e de dispositivos móveis, além de analistas de rede, de infraestrutura e de sistemas. De acordo com a Secretaria de Desenvolvimento Econômico, esses empreendimentos faturam R$ 10 milhões por mês.
E A CRISE?
Assim como o restante do país, a cidade sente alguns reflexos da retração econômica, mas segundo Eduardo Rino, economista e professor do Univem - Centro Universitário Eurípides de Marília -, de forma mais amena do que outros municípios.
“Não somos propriamente um oásis. Temos alguns diferenciais pontuais, como o fortalecimento da indústria e menor endividamento da população, que está comprando mais à vista”, diz.
O fechamento de uma unidade do Walmart em Marília, no final de 2015, eliminou 100 postos de trabalho na cidade. A boa notícia é que o prédio foi comprado por outra varejista – a rede de supermercados Confiança, que em três meses, abriu 400 novas vagas.
Outro exemplo citado por Rino é o da General Mills, dona da marca Yoki. A empresa encerrou as atividades na cidade, em agosto, e demitiu 100 funcionários, que foram rapidamente absorvidos por outra indústria alimentícia que dobrou seu volume de produção ao optar pela diversificação de produtos contra a crise.
A maioria das indústrias de alimentos da cidade vem de um período de investimento muito forte em novas linhas de produtos.
De acordo com o secretário municipal, a Nestlé vai começar a produzir cookies na cidade e contratou 120 trabalhadores.
A empresa informou que ampliou a produção e fez admissões, mas não confirmou o número de vagas abertas nem revelou o investimento em novos fornos para os biscoitos.
A Marilan, segunda maior fabricante de biscoitos do país, admitiu 300 trabalhadores para ampliar em 40% a capacidade de produção. Com três mil funcionários, dos quais 1,8 mil na fábrica, a companhia não revela as cifras investidas.
Para captação de novos investimentos, Pinto Júnior afirma que a administração tem buscado alternativas que estimulem o desenvolvimento econômico e social da cidade.
Entre as medidas, ele destaca um pacote que autoriza a redução da alíquota do ISSQN (Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza) de 5% para 2% para os serviços de TI e também na área de transportes, além da doação de terrenos municipais para a construção ou expansão de empresas.
Os incentivos têm gerado bons resultados. Entre as grandes empresas que anunciaram investimentos, recentemente, estão a Harald Chocolates e a RCG Tecnologia Eletromecânica.
De acordo com o secretário municipal, a indústria de chocolates Harald que já opera no município, estava negociando uma nova sede em São João da Boa Vista, a 234 quilômetros de São Paulo.
No entanto, uma nova negociação com Marília, incluindo a doação de um terreno, fez com que a Harald escolhesse a cidade para a construção de sua nova unidade para produção de castanhas, com um investimento de R$ 50 milhões.
O mesmo ocorreu com a RCG, produtora de lâmpadas de Led, que investirá R$ 20 milhões na área de 12 mil metros quadrados, que recebeu como incentivo da Prefeitura. Juntas, as duas empresas devem gerar mais de 800 empregos diretos para o município.
Diario do Comércio
Sobre o autor

Alberto Spoljarick Neto
Alberto Spoljarick Neto é o gerente de marketing e eventos da Associação Comercial e Industrial de Mogi Guaçu. Formado em Publicidade e Propaganda e Relações Públicas pela ESAMC, ele continua se aperfeiçoando em tendências de consumo de mercado e as aplicando para os empreendedores de nossa cidade.